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sexta-feira, 29 de junho de 2012

As raízes do Golpe político no Paraguai motivado pelos interesses da oligarquia agrária contra a política de reforma agrária de Lugo



O golpe político sofrido pelo Paraguai no último dia 22 de junho de 2012 tem forte relação com os interesses da oligarquia agrária do país que se sente ameaçada diante da política de reforma agrária que vinha sendo implementada por Fernando Lugo, presidente deposto. Mesmo tímida, a reforma agrária gerou no campo paraguaio o fortalecimento do movimento campesino na luta por terra. Na medida em que a economia do país está centrada da agricultura e pecuária é no campo onde a pressão social acontece por políticas públicas.

O Paraguai teve sua indústria arrasada após a guerra do Paraguai entre 1864 a 1870. A guerra destruiu a forte indústria paraguaia que nunca mais voltou a ser um país com índices de desenvolvimento industrial e econômico como antes. O país manteve-se agrário desde então e passou, durante todo esse tempo, por dificuldades políticas e econômicas administrado pela oligarquia agrária.

Antes da guerra, o Paraguai passou por esse processo de desenvolvimento industrial e econômico. Esse desenvolvimento ocorreu a partir de decisões tomadas pelo Governo de Francia que transformou latifúndios em fazendas do Estado, diversificou a economia, monopolizou o comércio exterior e confiscou as propriedades dos grandes empresários rurais. Seus sucessores Carlos Antônio López e seu filho Francisco Solano López mantiveram e ampliaram essa política que trouxe como consequência uma economia sólida e uma força militar considerável.

Com essa política de desenvolvimento econômico combinado com distribuição de riqueza e terras, o Paraguai passou a ser um dos países mais desenvolvidos da América do Sul. Todo esse avanço amedrontava os ingleses que estavam à procura de novos mercados consumidores. A Inglaterra criou uma guerra contra o Paraguai para destruir a economia paraguaia. Ficou sobre a responsabilidade do exército do Brasil, Argentina e Uruguai destruir o Paraguai que não se recuperou até os dias atuais.

A política econômica de Fernando Lugo fez o país iniciar um processo de expansão econômica. Em 2010, o Paraguai experimentou a maior expansão econômica da região e a mais alta da América Latina, com uma perspectiva histórica de crescimento do PIB de 13%. Só no primeiro semestre de 2010, o país teve um crescimento econômico de 14%. Com sua economia ainda agrária, esse crescimento econômico vem ocorrendo no campo onde os grandes produtores rurais continuam soberanos com produções agrícolas voltadas para exportações (plantation).

Entretanto, esse crescimento não teria sentido algum para a população pobre paraguaia se não fosse para distribuir renda e gerar emprego. A política de reforma agrária que Lugo iniciou, provocou um movimento dos poderosos do país que começaram a ver o poder ameaçado. Depois da guerra do Paraguai, quando a indústria paraguaia foi destruída, a oligarquia rural governará soberana o país sem ameaças tão reais ao seu poder. Esse grupo não permite que os pobres e miseráveis tenham condições de vida digna, pois são as condições de miséria que manter a riqueza de poucos e a miséria da maioria. É nesse cenário que vai acontecer o golpe político, vejamos:

Uma semana antes do golpe, ocorreu um massacre de trabalhadores rurais no Paraguai por policiais da força nacional. O fato ocorreu próximo à fronteira com o Brasil, numa localidade conhecida como Ybyrá Pytá em Curuguaty e teve como saldo oficial ao menos 17 mortos, entre os quais seis policiais e onze trabalhadores rurais, além de dezenas de feridos de ambos os lados. O confronto ocorreu quando policiais fortemente armados tentou desocupar uma fazenda pertencente a um tradicional político e latifundiário do país, Blas Riquelme. Embora o local tenha sido descrito como uma reserva florestal que se localizava no interior da fazenda de Riquelme, as filmagens realizadas e disponíveis através do youtube, mostram plantações de milho o que indicava se tratar de terra provavelmente grilada, ou área ilegal de atividade agrícola. Essas propriedades vêm sendo adquiridas de maneira irregular desde os anos 70 pelos apoiadores da ditadura civil-militar de Alfredo Stroessner (1954-89). Essas propriedades atualmente são ocupadas pelo agronegócio comandado pelos políticos e empresários financiadores desses políticos que deram o golpe no dia 22 de junho de 2012, destituindo o presidente eleito Fernando Lugo em 2008.

A política de reforma agrária que Lugo vinha implementando no país visava o Estado reassumir o controle sobre essas terras griladas e invadidas, com títulos precários, pelos grandes proprietários. Essas terras deveriam ser desapropriadas para reforma agrária. O movimento campesino paraguaio que agrega trabalhadores sem-terra, desempregados, indígenas e miseráveis segregados pelo latifúndio vem lutando, também, para que o governo apresse o processo de desapropriação. Os campesinos passaram a contestar os precários títulos de propriedade concedidos durante a ditadura civil-militar do país, ocupando fazendas e áreas griladas e pressionando pela imediata reforma agrária.

A região onde aconteceu o conflito que resultou na movimentação da burguesia agrária paraguaia para destituir do poder Fernando Lugo é considerada uma das mais férteis do Paraguai. As terras estão nas mãos de agricultores brasileiros ou residentes no Paraguai, os brasiguaios. Essas terras são destinadas a produção para exportação com uso de elevada tecnologia, situação que exclui os trabalhadores rurais do direito a terra e ao emprego.

Chama atenção quando o assunto aparece na imprensa brasileira fica uma série de interrogações do por que dos conflitos e do golpe. A imprensa brasileira não quer colocar para população que o golpe e os conflitos agrários no Paraguai têm por trás brasileiros ou brasiguaios grandes proprietários de terras no país que financiam políticos paraguaios para manter seus privilégios.

Vale registrar que os conflitos agrários existem há décadas no Paraguai. Entretanto, aumentou nos anos 90 depois do fim do regime ditatorial de Alfredo Stroessner (1954-89) e o reestabelecimento da democracia. Nesse período, também, ocorreu um avanço do agronegócio sobre a estrutura fundiária paraguaia. Nos anos 2000, o movimento campesino paraguaio se encontrava bastante organizados. No auge de um destes conflitos contra os brasiguaios chegaram a ocupar os microfones de uma rádio na cidade de San Alberto, de onde liam e narravam, em guarani, língua de origem indígena, falada em todo o território nacional, passagens da guerra do Paraguai (1964-70) e a necessidade da organização dos trabalhadores na luta pelo direito á terra griladas e ocupadas pelo agronegócio, a títulos precários, concedidos pela ditadura.

A imprensa brasileira passou a classificar essa mobilização dos trabalhadores paraguaios de xenofobia, construindo uma versão segundo a qual a população rural pobre do Paraguai agiria movida por um sentimento de inveja contra os brasileiros que chegaram ao país na década de 1970. Esses brasileiros, grandes proprietários de terras paraguaias, teriam trabalhado duro a fim de desenvolver as bases produtivas agrárias que colocaram o Paraguai na rota do rico mercado do agronegócio. Vale lembrar que a crítica dos trabalhadores à apropriação fundiária por estrangeiros se constituiu numa das bases sob a qual Fernando Lugo, ex-bispo católico está ligado à Teologia da Libertação.

Para os paraguaios, a propriedade agrícola brasiguaia representa sua expropriação e exclusão, e é ela que está na raiz da miséria de todo um povo. A política de reforma agrária que vinha sendo realizada por Lugo representava, portanto, os anseios da população. O golpe foi político na medida em que representou a defesa dos interesses do agronegócio que ocupou as terras ilegalmente. Pois os indígenas expulsos de suas terras se tornaram moradores de rua em centros urbanos reduzidos à extrema pobreza, ou realocados em "reservas” sem a mínima infraestrutura de escola, posto de saúde, casas de alvenaria, estradas etc, além da inexistência de recursos naturais necessários à reprodução de seu modo de vida natural, ou seja, sem florestas de onde poderiam tirar água, madeira, frutas, raízes e legumes, peixes, ervas medicinais e caça etc. Essas reservas indígenas hoje estão rodeadas pelos grandes plantações de sojas dos brasileiros, que, não satisfeitos, acabam por "arrendar” as terras indígenas pagando preços miseráveis, sem que precise pagar mais impostos ou se importar com a destruição da terra pelo uso constante de agrotóxicos.

O Golpe no Paraguai foi anunciado no final de 2009. Em entrevista a Rádio Nacional de Buenos Aires na Argentina o Senador Paraguaio Alfredo Luis do Partido Liberal já vinha defendendo o golpe para que as elites paraguaias voltassem a assumir o comando do país. Essa defesa se concretizou em 2012 com o golpe político.

Em 2011, o Wikileaks divulgou documentos secretos da embaixada dos Estados Unidos no Paraguai sobre o planejamento do golpe em 2009. Segundo o portal Carta Maior, a partir de documentos divulgados pelo Wikileaks, despacho sigiloso da Embaixada dos Estados Unidos em Assunção, dirigido ao Departamento de Estado, em Washington, já informava, em 28 de março de 2009, a intenção da direita paraguaia de organizar um 'golpe democrático' no Congresso para destituir Lugo. Esse ‘golpe democrático’ ocorreu com impeachment de Lugo consumado no último dia 22 de junho de 2012 pelo congresso paraguaio.

O comunicado da embaixada estadunidense, divulgado pelo Wikileaks em 30 de Agosto de 2011 (http://wikileaks.org/cable/2009/03/09ASUNCION189.html) mostra que o plano era substituir Lugo pelo vice, Federico Franco, que assumiu agora com o golpe político. O texto enviado a Washington faz várias ressalvas. Argumenta que as condições políticas não estavam maduras para um golpe e mostrava reticências em relação a seus idealizadores naquele momento. Dos planos participavam então o general Lino Oviedo ligado a interesses do agronegócio brasileiro no Paraguai, que agora pressionam Dilma a reconhecer a legitimidade de Federico Franco e o ex-presidente Nicanor Duarte Frutos. Em seu governo (2003-2008), o colorado Nicanor Duarte Frutos foi duramente criticado por vários governos latino-americanos por ter permitido o ingresso de tropas estadunidenses no território paraguaio para exercícios conjuntos com o exército do país. Foi em seu mandato também que os Estados Unidos tiveram permissão para construir uma base militar na zona da Tríplice Fronteira com gigantesca pista de pouso, supostamente para combater narcotráfico e o terrorismo islâmico.

As condições políticas ficaram maduras para o golpe no Paraguai com o conflito em Ybyrá Pytá. O certo é que a reação contrária dos países latino-americanos contra o golpe vem incomodando os golpistas. Fernando Lugo deve retornar ao poder, pois foi eleito pelo povo paraguaio e deve governar para o povo paraguaio.

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