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segunda-feira, 10 de março de 2014

É meu dever dizer aos jovens o que é um golpe de Estado

Publicado em 20/02/2014 do Blog de Hildegard Angel

**Há cheiro de 1964 no ar. Não apenas no Brasil, mas também nas vizinhanças. Acho então que é chegada a hora de dar o meu depoimento. Dizer a vocês, jovens de 20, 30, 40 anos de meu Brasil, o que é de fato uma ditadura.

Se a Ditadura Militar tivesse sido contada na escola, como são a Inconfidência Mineira e outros episódios pontuais de usurpação da liberdade em nosso país, eu não estaria me vendo hoje obrigada a passar sal em minhas tão raladas feridas, que jamais pararam de sangrar. Fazer as feridas sangrarem é obrigação de cada um dos que sofreram naquele período e ainda têm voz para falar.

Alguns já se calaram para sempre. Outros, agora se calam por vontade própria. Terceiros, por cansaço. Muitos, por desânimo. O coração tem razões… Eu falo e eu choro e eu me sinto um bagaço. Talvez porque a minha consciência do sofrimento tenha pegado meio no tranco, como se eu vivesse durante um certo tempo assim catatônica, sem prestar atenção, caminhando como cabra cega num cenário de terror e desolação, apalpando o ar, me guiando pela brisa. E quando, finalmente, caiu-me a venda, só vi o vazio de minha própria cegueira.

Meu irmão, meu irmão, onde estás? Sequer o corpo jamais tivemos.

Outro dia, jantei com um casal de leais companheiros dele. Bronzeados, risonhos, felizes. Quando falei do sofrimento que passávamos em casa, na expectativa de saber se Tuti estaria morto ou vivo, se havia corpo ou não, ouvi: “Ah, mas se soubessem como éramos felizes… Dormíamos de mãos dadas e com o revólver ao lado, e éramos completamente felizes”. E se olharam, um ao outro, completamente felizes. Ah, meu deus, e como nós, as famílias dos que morreram, éramos e somos completamente infelizes!

A ditadura militar aboletou-se no Brasil, assentada sobre um colchão de mentiras ardilosamente costuradas para iludir a boa fé de uma classe média desinformada, aterrorizada por perversa lavagem cerebral da mídia, que antevia uma “invasão vermelha”, quando o que, de fato, hoje se sabe, navegava célere em nossa direção, era uma frota americana.

Deu-se o golpe! Os jovens universitários liberais e de esquerda não precisavam de motivação mais convincente para reagir. Como armas, tinham sua ideologia, os argumentos, os livros. Foram afugentados do mundo acadêmico, proibidos de estudar, de frequentar as escolas, o saber entrou para o índex nacional engendrado pela prepotência.
As pessoas tinham as casas invadidas, gavetas reviradas, papéis e livros confiscados. Pessoas eram levadas na calada da noite ou sob o sol brilhante, aos olhos da vizinhança, sem explicações nem motivo, bastava uma denúncia, sabe-se lá por que razão ou partindo de quem, muitas para nunca mais serem vistas ou sabidas. Ou mesmo eram mortas à luz do dia. Ra-ta-ta-ta-tá e pronto.

E todos se calavam. A grande escuridão do Brasil. Assim são as ditaduras. Hoje ouvimos falar dos horrores praticados na Coreia do Norte. Aqui não foi muito diferente. O medo era igual. O obscurantismo igual. As torturas iguais. A hipocrisia idêntica. A aceitação da sobrevivência. Ame-me ou deixe-me. O dedurismo. Tudo igual. Em número menor de indivíduos massacrados, mas a mesma consistência de terror, a mesma impotência.

Falam na corrupção dos dias de hoje. Esquecem-se de falar nas de ontem. Quando cochichavam sobre “as malas do Golbery” ou “as comissões das turbinas”, “as compras de armamento”. Falavam, falavam, mas nada se apurava, nada se publicava, nada se confirmava, pois não havia CPI, não havia um Congresso de verdade, uma imprensa de verdade, uma Justiça de verdade, um país de verdade.

E qualquer empresa, grande, média ou mínima, para conseguir se manter, precisava obrigatoriamente ter na diretoria um militar. De qualquer patente. Para impor respeito, abrir portas, estar imune a perseguições. Se isso não é um tipo de aparelhamento, o que é, então? Um Brasil de mentirinha, ao som da trilha sonora ufanista de Miguel Gustavo.

Minha família se dilacerou. Meu irmão torturado, morto, corpo não sabido. Minha mãe assassinada, numa pantomima de acidente, só desmascarada 22 anos depois, pelo empenho do ministro José Gregory, com a instalação da Comissão dos Mortos e Desaparecidos Políticos no governo Fernando Henrique Cardoso.

Meu pai, quatro infartos e a decepção de saber que ele, estrangeiro, que dedicou vida, esforço e economias a manter um orfanato em Minas, criando 50 meninos brasileiros e lhes dando ofício, via o Brasil roubar-lhe o primogênito, Stuart Edgar, somando no nome homenagens aos seus pai e irmão, ambos pastores protestantes americanos – o irmão, assassinado por membro louco da Ku Klux Klan. Tragédia que se repetia.

Minha irmã, enviada repentinamente para estudar nos Estados Unidos, quando minha mãe teve a informação de que sua sala de aula, no curso de Ciências Sociais, na PUC, seria invadida pelos militares, e foi, e os alunos seriam presos, e foram. Até hoje, ela vive no exterior.

Barata tonta, fiquei por aí, vagando feito mariposa, em volta da fosforescência da luz magnífica de minha profissão de colunista social, que só me somou aplausos e muitos queridos amigos, mas também uma insolente incompreensão de quem se arbitrou o insano direito de me julgar por ter sobrevivido.

Outra morte dolorida foi a da atriz, minha verdadeira e apaixonada vocação, que, logo após o assassinato de minha mãe, precisei abdicar de ser, apesar de me ter preparado desde a infância para tal e já ter então alcançado o espaço próprio. Intuitivamente, sabia que prosseguir significaria uma contagem regressiva para meu próprio fim.

Hoje, vivo catando os retalhos daquele passado, como acumuladora, sem espaço para tantos papéis, vestidos, rabiscos, memórias, tentando me entender, encontrar, reencontrar e viver apesar de tudo, e promover nessa plantação tosca de sofrimentos uma bela colheita: lembrar os meus mártires e tudo de bom e de belo que fizeram pelo meu país, quer na moda, na arte, na política, nos exemplos deixados, na História, através do maior número de ações produtivas, efetivas e criativas que eu consiga multiplicar.

E ainda há quem me pergunte em quê a Ditadura Militar modificou minha vida! Hildegard Angel

**O primeiro parágrafo original deste texto, que fazia referência à possível iminente tomada do poder de um governo eleito democraticamente, na Venezuela, foi trocado pela frase sucinta aqui vista agora, às 15h06m deste dia 24/02/2014, porque o foco principal do assunto (a ditadura brasileira) foi desviado nos comentários. Meus ombros já são pequenos para arcarem com a nossa tragédia. Que dirá com a da Venezuela!

*** Pelo mesmo motivo acima exposto, os comentários que se referiam à questão na Venezuela referida no antigo primeiro parágrafo foram retirados pois perderam o sentido no contexto, pedindo desculpa aos autores dos textos, muitos deles objeto de reflexão honesta e profunda, e merecedores de serem conhecidos, mas não há motivação para mantê-los aqui no ar. O nível de truculência a que levou a discussão não me permite estimulá-la.

domingo, 9 de março de 2014

Os sonegadores irão para a Papuda? Em 2013 os ricos sonegaram R$ 415 bilhões de impostos

Por Altamiro Borges, Fonte Agência Carta Maior

Estudo do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda revelou que a sonegação de impostos em 2013 atingiu a soma de R$ 415 bilhões.

Estudo do Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda (Sinprofaz) divulgado na semana passada revelou que a sonegação de impostos em 2013 atingiu a soma de R$ 415 bilhões. Ainda segundo a pesquisa, todos os tributos não pagos, inscritos na Dívida Ativa da União, ultrapassaram R$ 1 trilhão e 300 milhões. Com esta grana, o Brasil teria condições de enfrentar os graves problemas nas áreas da saúde, educação e mobilidade urbana, entre outros.

Mas os empresários e os ricaços, os principais sonegadores, preferem criticar o “impostômetro” – até como forma de ocultar o criminoso “sonegômetro”. Eles sabem que nunca irão para o presídio da Papuda nem serão alvos da escandalização da mídia – até porque a Rede Globo ainda não mostrou o Darf do pagamento do seu calote.

A sonegação de R$ 415 bilhões somente no ano passado corresponde aproximadamente a 10% do Produto Interno Bruto (PIB), a soma de todas as riquezas produzidas pelo país. O valor supera, com folga, os orçamentos federais de 2014 para as pastas da educação, saúde e desenvolvimento social – somados.

Para uma simples comparação, o programa Bolsa Família investe R$ 24 bilhões ao ano para atender 14 milhões de famílias. O que foi sonegado somente em 2013 pelos ricaços equivale, portanto, a 17 anos deste programa do governo federal. Segundo Heráclio Mendes de Camargo Neto, presidente do Sinprofaz, os altos valores “são sonegados pelos muitos ricos e por pessoas jurídicas (empresas), com mecanismos sofisticados de lavagem de dinheiro e caixa dois”.

O estudo do sindicato poderia servir como base para enviar à cadeia centenas de sonegadores bilionários – alguns deles, provavelmente presentes no último ranking dos ricaços da Forbes. Ele também serve para alimentar o debate sobre a urgência da reforma tributária no Brasil.

Como aponta o Sinprofaz, quem paga impostos no país é o trabalhador. Os ricaços sonegam e ainda são beneficiados por um sistema injusto, baseado em impostos regressivos e indiretos. Quem ganha mais, paga menos; e vice-versa. “Mesmo que você seja isento do Imposto de Renda, vai gastar cerca de 49% do salário em tributos, mas quase tudo no supermercado ou na farmácia", explica Camargo Neto à reportagem da Rede Brasil Atual.

Além disso, quanto mais o contribuinte tem a declarar, maiores são as chances de abater os valores. “Os mais ricos podem abater certos gastos no Imposto de Renda. Em saúde, por exemplo, se você tem um plano privado um pouco melhor, você pode declará-lo e vai ter abatimento no cálculo final do imposto. Esta é uma característica injusta do nosso sistema. Os mais pobres não conseguem ter esse favor”, completa o sindicalista. Já o trabalhador não tem como escapar da fúria do Leão. Quem tem salário a partir de R$ 2.400 é tributado automaticamente pelo Imposto de Renda Retido na Fonte. Apesar destas distorções, os empresários ainda tentam se apresentar como vítimas de uma carga tributária injusta. Sonegam e/ou pagam pouco e ainda se travestem de vítimas!

Em 2005, o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário e a Associação Comercial de São Paulo criaram o “impostômetro” e instalaram um painel eletrônico no Pátio do Colégio, no centro da capital paulista. Segundo a Rede Brasil Atual, na semana passada o placar registrava R$ 313 bilhões em impostos pagos. “Se nós conseguirmos cobrar essas grandes empresas e pessoas físicas muito ricas, o governo poderia desonerar a classe média e os mais pobres. Seria o mais justo. Se todos pagassem o que devem, nós poderíamos corrigir a tabela do Imposto de Renda e reduzir alíquotas sobre alimentos e produtos de primeira necessidade, que todo mundo usa”, conclui Camargo Neto, desmascarando os ricaços sonegadores – verdadeiros impostores!

TRÁFICO HUMANO

Dom Demétrio Valentini do site Adital

O tema da Campanha da Fraternidade deste ano de 2014 começa nos intrigando. Pois parece acenar para um assunto que não faria parte de nossa realidade. Ao falar de "tráfico humano”, num primeiro momento a expressão pareceria exagerada, dado que o regime de escravidão já foi banido em todos os países, ao menos oficialmente.

Acontece que esta é uma realidade tão disfarçada, que facilmente é encoberta, e passa despercebida, valendo-se de expedientes muito sofisticados, que produzem situações de verdadeiro comércio de pessoas, altamente lucrativo e à custa do regime de verdadeira escravidão, em que muitas pessoas se vêem envolvidas.

Por isto, desta vez, a Campanha sugere que, primeiro, nos demos conta da verdadeira dimensão da realidade que deve ser denunciada como um verdadeiro "tráfico de pessoas humanas”, que acontece em nosso tempo, fruto dos diversos tipos de exploração a que são submetidas milhões de pessoas.

Desta vez a Campanha começa nos alertando a sermos mais perspicazes, para perceber as tramas em que muitas pessoas se vêem enredadas, e delas não conseguem mais se desvencilhar.

A primeira tarefa, portanto, é conferir a realidade, ajudados pelas estatísticas que a própria ONU nos apresenta. Mesmo sabendo como é difícil obter dados precisos a respeito de uma realidade que costuma ser acobertada, os dados são mais do que suficientes para flagrar a gravidade da situação.

Vale a pena deter-nos, num primeiro momento, a olhar os fatos. Segundo cálculos feitos a partir de constatações comprovadas, o tráfico de pessoas humanas rende, anualmente, trinta e dois bilhões de dólares.

De acordo com a Organização Internacional do Trabalho vinte milhões de pessoas são vítimas de trabalho forçado. Destas, 4,5 milhões (22%) são exploradas em atividades sexuais forçadas; 14,2 milhões (68%), em trabalhos forçados em diversas atividades econômicas; 2,2 milhões (10%) pelo próprio Estado, sobretudo os militarizados.

Segundo a mesma pesquisa, 11,4 milhões (55%) são mulheres e jovens; 9,5 milhões (45%), homens e jovens. Em relação à idade: 15,4 milhões (74%) são adultos; os outros 5,5 milhões (26%) têm até 17 anos, o que mostra ser alto o número de traficados entre crianças e jovens.

As vítimas do tráfico humano são presas fáceis dos que se aproveitam de situações de vulnerabilidade na luta pela sobrevivência. Os aliciadores iludem pessoas com promessas de emprego garantido, alta remuneração, documentação assegurada, entrada para o mundo dos modelos de grandes marcas ou para o mundo dos artistas de muitas áreas, especialmente a dança.

Aparentemente, nada que se pareça com tráfico. Por isso, as pessoas enredadas não querem falar, por constrangimento de reconhecer que foram ludibriadas, por vergonha de contar o que estão passando. É um crime invisível e silencioso, que descobriu na fraqueza humana o jeito de se disfarçar, para encobrir os seus procedimentos.

Como o cego de Jericó, sentado à beira do caminho, também pedimos: "Senhor, que eu veja!”. Esta Campanha tem ainda outras realidades a nos mostrar!

sexta-feira, 7 de março de 2014

A revolução bolivariana na Venezuela e os princípios da via chilena ao socialismo de Allende

A partir de uma coalizão dos partidos de esquerda e centro, em 1970 Salvador Allende foi eleito presidente do Chile. Allende contava com grande apoio dos trabalhadores urbanos e camponeses e desde os primeiros momentos pretendia construir uma sociedade socialista centrada nos princípios da liberdade, do pluralismo e da democracia. Essa proposta foi chamada de “via chilena ao socialismo”.

O governo Allende estava comprometido com o processo de nacionalização da economia, reforma agrária e elevação do nível de vida dos trabalhadores. Nesse sentido, apostou nas reformas estruturais que visavam fortalecer as massas trabalhadoras e ao mesmo tempo destruir o predomínio econômico e imperialista, abrindo caminho para a construção de uma sociedade socialista. Allende nacionalizou as riquezas do subsolo, com destaque para o cobre, principal riqueza mineral do Chile, decisão que gerou forte reação das elites chilenas com apoio do imperialismo estadunidense. As elites organizaram a greves dos caminhões que provocou desabastecimento em todo país.

A derrota eleitoral das elites em 1973 fortaleceu a política de Allende em aprofundar as reformas, entretanto, a reação conservadora das elites provocou levantes militares, atentados terroristas, greves em todo país. Esse cenário político teve total apoio dos Estados Unidos que resultou no golpe de Setembro de 1973, que derrubou o governo popular. O golpe foi seguido dos confrontos nas ruas com massacre nos bairros operários e fábricas ocupadas responsável por cerca de 10 mil mortos e milhares de prisões. O ataque ao Palácio de La Moneda, onde Allende resistiu, acabou com seu assassinado e completou a vitória da extrema direita e da CIA sobre as forças populares chilenas.

O projeto socialista empreendido pelo governo Allende de Unidade Popular é um tema que até hoje divide grande parte do país, principalmente daqueles que viveram essa experiência pioneira. Entre as ações adotadas podemos destacar: a entrega de meio litro de leite diário para todas as crianças; a instalação de consultórios materno-infantil em todos os bairros; Medicina gratuita nos hospitais públicos com entrega gratuita de medicamentos; supressão dos altos salários dos funcionários de confiança; aprofundamento da Reforma Agrária; bolsas para os estudantes do ensino básico, médio e universitário; criação de um sistema de previdência universal solidário com fundos estatais; criação do Ministério de proteção da família.

Além de nacionalizar as riquezas do subsolo, Allende implementou um cronograma para execução das reformas, rumo a construção do socialismo. No cronograma estava a expropriação das fábricas e das fazendas improdutivas. Esse processo tinha que ser realizado de forma gradual, controlada e planejada, juntamente com a expropriação dos bancos e das empresas de capital estrangeiro.

O projeto da via chilena ao socialismo implementado por Allende foi uma experiência inédita que não existiu em nenhum lugar que podia dar indícios do caminho a ser percorrido de uma transição pacífica, institucional e democrática para o socialismo. Durante todo governo, diante os conflitos seu governo procurou encontrar as saídas e os consensos que lhe permitissem seguir impulsionando seu programa sobre bases democráticas.

Na Venezuela desde 1999 está em curso o que podemos chamar da via venezuelana ao socialismo, chamada por Hugo Chaves como Revolução Bolivariana. Nesse período são inegáveis os avanços conquistados e impulsionados pela receita petroleira que foi nacionalizada e utilizada para promover as reformas, melhorar os serviços públicos e distribuir riqueza para população mais pobre. Essas riquezas, antes estavam sobre controle das elites e do capital internacional.

A nacionalização da empresa de petróleo PDVSA, em 2003, permitiu que a Venezuela recuperasse sua soberania energética. O país ainda criou a Petrocaribe, em 2005, permitindo que 18 países da América Latina e do Caribe adquirissem petróleo subsidiado com preço de 40% a 60% menor que o mercado, assegurando seu abastecimento energético e beneficiando em torno de 90 milhões de pessoas.

Outros setores foram nacionalizados como: setor elétrico e de telecomunicação (CANTV e Eletricidade de Caracas) que permitiram pôr fim a situações de monopólio e universalizar o acesso a esses serviços. Pela primeira vez em sua história, a Venezuela dispõe de seus próprios satélites (Bolívar e Miranda). O país é agora soberano no campo da tecnologia espacial. Há internet e telecomunicações em todo o território.

Atualmente, a Venezuela apresenta a sociedade com melhor repartição de renda da América do Sul, de acordo com o índice Gini, além do maior salário mínimo regional, atestado pela Organização Mundial do Trabalho. Registra, na última década, o mais acelerado padrão de crescimento do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do subcontinente, segundo relatório das Nações Unidas. Foi declarada território livre de analfabetismo pela Unesco, em 2006, resultados da universalização de direitos sociais, sob o comando do Estado, em um processo financiado pela progressiva nacionalização dos recursos minerais, especialmente do petróleo.

Segundo site Opera Mundi, o número de crianças na escola passou de 6 milhões em 1998 para 13 milhões em 2011. A taxa de escolarização no ensino fundamental é de 93,2%, já no ensino médio a taxa de escolarização é de 73,3%. O Estado venezuelano vem investindo na criação de novas universidades, ampliando o acesso ao ensino superior para a juventude. A taxa de mortalidade infantil passou de 19,1 a cada mil, em 1999, para 10 a cada mil em 2012. De 1999 a 2011, a taxa de pobreza passou de 42,8% para 26,5%, e a taxa de extrema pobreza passou de 16,6% em 1999 para 7%. A taxa de desnutrição infantil reduziu 40% desde 1999. Em 2012 95% da população tinha acesso a água potável. Desde 1999 foram construídas 700 mil moradias na Venezuela e o governo entregou mais de um milhão de hectares de terras aos povos originários do país. A taxa de desnutrição passou de 21% em 1998 para menos de 3% em 2012. Segundo a FAO, a Venezuela é o país da América Latina e do Caribe mais avançado na erradicação da fome.

Desde 1999, foram criadas mais de 50.000 cooperativas em todos os setores da economia. A taxa de desemprego passou de 15,2% em 1998 para 6,4% em 2012, com a criação de mais de 4 milhões de postos de trabalho. O salário mínimo passou de 100 bolívares (16 dólares) em 1998 para 2.047,52 bolívares (330 dólares) em 2012, ou seja, um aumento de mais de 2.000%. Trata-se do salário mínimo mais elevado da América Latina. As mulheres desprotegidas, assim como as pessoas incapazes, recebem uma ajuda equivalente a 70% do salário mínimo. A jornada de trabalho foi reduzida para 6 horas diárias e a 36 horas semanais sem diminuição do salário.

É preciso registrar que Hugo Chaves foi um estudioso da experiência chilena de Salvador Allende e sempre afirmou que não se pode fazer reformas estruturais com as velhas instituições forjadas pelas elites. Para Chaves, somente com apoio popular seria possível à ruptura com o sistema político e econômico imposto na Venezuela pelas elites e o imperialismo estadunidense.

Amparado numa maioria parlamentar identificada com as reformas para construção da Revolução Bolivariana, Chaves iniciou sua batalha através da convocação de uma Assembleia Constituinte que refundasse o Estado, dotando-o de mecanismos democráticos que ampliassem a participação popular, reduzindo a influência dos antigos grupos que dominavam o país até então. A nova constituição instituiu mecanismos plebiscitários, de caráter impositivo, que poderiam ser convocados tanto pelo parlamento e o governo quanto por iniciativa de cidadãos.

A Constituição também adotou a possibilidade de referendos revogatórios de todos os mandatos, inclusive o presidencial, desde que subscrito por ao menos 20% dos eleitores. O próprio Chávez enfrentou votação de referendo para revogação de seu mandato em 2004 e foi mantido no poder com ampla maioria, entretanto, muitos governadores, prefeitos e deputados não foram referendados pelo povo e foram afastados.

Chávez recorreu às urnas, através de eleições ou consultas, para cada um de seus passos estratégicos a fim de implementar das reformas estruturais. Foram 16 (dezesseis) processos eleitorais gerais desde 1998, sempre com a presença de observadores internacionais das mais distintas correntes. O ex-presidente dos Estados Unidos, Jimmy Carter, chegou a citar o sistema eleitoral venezuelano como “o mais aperfeiçoado do mundo”.

Nos últimos anos, o governo implementou políticas que reduz o poder dos grandes empresários com a criação do desenvolvimento local, chamado de poder comunal. Trata-se de pequenas áreas geográficas, distritos ou bairros, que funcionam como instituições políticas, mas também podem organizar seus próprios serviços públicos, constituir empresas para diferentes atividades e receber financiamento direto do governo nacional. Buscou-se, assim, horizontalizar o Estado e esvaziar a burocracia estatal ainda controlada ou corrompida pelas elites.

Esse processo levou a uma profunda politização da sociedade que passou a defender o governo. O próprio Partido Socialista Unificado da Venezuela, principal agremiação governista, nasce desse ambiente incentivado pela radicalização democrática. Podemos considerar que o legado de Hugo Chávez foi a radicalização da democracia. É diante desse cenário de fortalecimento da democracia no país que se inicia no país uma forte reação das elites com apoio dos Estados Unidos e seus meios de comunicações.

A reação das elites diante da via venezuelana ao socialismo vem se fortalecendo com apoio do imperialismo estadunidense e dos grupos neonazistas dos países centrais. Esses grupos já conseguiram destituir o presidente eleito da Ucrânia Viktor Yanukovich, eleito democraticamente, e estão tentando fazer o mesmo na Venezuela para barrar a continuidade da Revolução Bolivariana. O papel da esquerda latino-americana nesse momento é unir forças contra um possível novo golpe que está em curso na Venezuela com apoio direto dos Estados Unidos como aconteceu na Ucrânia.

Com informações do site Opera mundi