Dom Demétrio Valentini do site Adital
O tema da Campanha da Fraternidade deste ano de 2014 começa nos intrigando. Pois parece acenar para um assunto que não faria parte de nossa realidade. Ao falar de "tráfico humano”, num primeiro momento a expressão pareceria exagerada, dado que o regime de escravidão já foi banido em todos os países, ao menos oficialmente.
Acontece que esta é uma realidade tão disfarçada, que facilmente é encoberta, e passa despercebida, valendo-se de expedientes muito sofisticados, que produzem situações de verdadeiro comércio de pessoas, altamente lucrativo e à custa do regime de verdadeira escravidão, em que muitas pessoas se vêem envolvidas.
Por isto, desta vez, a Campanha sugere que, primeiro, nos demos conta da verdadeira dimensão da realidade que deve ser denunciada como um verdadeiro "tráfico de pessoas humanas”, que acontece em nosso tempo, fruto dos diversos tipos de exploração a que são submetidas milhões de pessoas.
Desta vez a Campanha começa nos alertando a sermos mais perspicazes, para perceber as tramas em que muitas pessoas se vêem enredadas, e delas não conseguem mais se desvencilhar.
A primeira tarefa, portanto, é conferir a realidade, ajudados pelas estatísticas que a própria ONU nos apresenta. Mesmo sabendo como é difícil obter dados precisos a respeito de uma realidade que costuma ser acobertada, os dados são mais do que suficientes para flagrar a gravidade da situação.
Vale a pena deter-nos, num primeiro momento, a olhar os fatos. Segundo cálculos feitos a partir de constatações comprovadas, o tráfico de pessoas humanas rende, anualmente, trinta e dois bilhões de dólares.
De acordo com a Organização Internacional do Trabalho vinte milhões de pessoas são vítimas de trabalho forçado. Destas, 4,5 milhões (22%) são exploradas em atividades sexuais forçadas; 14,2 milhões (68%), em trabalhos forçados em diversas atividades econômicas; 2,2 milhões (10%) pelo próprio Estado, sobretudo os militarizados.
Segundo a mesma pesquisa, 11,4 milhões (55%) são mulheres e jovens; 9,5 milhões (45%), homens e jovens. Em relação à idade: 15,4 milhões (74%) são adultos; os outros 5,5 milhões (26%) têm até 17 anos, o que mostra ser alto o número de traficados entre crianças e jovens.
As vítimas do tráfico humano são presas fáceis dos que se aproveitam de situações de vulnerabilidade na luta pela sobrevivência. Os aliciadores iludem pessoas com promessas de emprego garantido, alta remuneração, documentação assegurada, entrada para o mundo dos modelos de grandes marcas ou para o mundo dos artistas de muitas áreas, especialmente a dança.
Aparentemente, nada que se pareça com tráfico. Por isso, as pessoas enredadas não querem falar, por constrangimento de reconhecer que foram ludibriadas, por vergonha de contar o que estão passando. É um crime invisível e silencioso, que descobriu na fraqueza humana o jeito de se disfarçar, para encobrir os seus procedimentos.
Como o cego de Jericó, sentado à beira do caminho, também pedimos: "Senhor, que eu veja!”. Esta Campanha tem ainda outras realidades a nos mostrar!
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